segunda-feira, 24 de maio de 2010

4 meses depois: as coisas dele... (Diário da Mirys)

4 meses se passaram... 4 meses... ainda parece que foi ontem... ainda parece que não aconteceu...

Mas aconteceu e eu preciso organizar algumas coisas na minha (nossa) vida. Dentre elas, desmontar o guarda-roupas dele. Ai meus sais... alguém me faz dormir por uns anos e só acordar em 2020?...

Não dá pra reclamar: tive quatro meses. 120 dias para colocar a cabeça em ordem, pensar direitinho, separar as coisas com cuidado, ME organizar pra essa tarefa. Até comentei com o meu pai, há um tempinho: "-preciso desocupar a casa...". E ele, brincalhão como sempre, me provocou: "-por que? O proprietário está te pedindo, por acaso?" (o proprietário, no caso, é ele. E a minha mãe.) "-esquenta não, filhota. Quando der, você tira..."

E eu adiando...

Na verdade, sabia direitinho porque estava adiando: não queria ninguém comigo nessa hora e tenho a sensação de que, em Jaú, nunca consigo ficar sozinha (de verdade, assim, fisicamente). Se falo que vou buscar pão, alguém vai junto. Vou no cinema, alguém oferece companhia. Vou na casa de uma amiga (não vou, mas queria sair), alguém se prontifica a dirigir pra mim... Por um lado, adoro essa rede de apoio INCRÍVEL que tenho. Por outro lado, queria respirar... sozinha... e não tem como dizer isso para os outros sem chatear ninguém... (por isso, levei uns meses para escrever esse texto, como se fosse no dia exato).

Eu não sabia o que ia acontecer comigo na casa. Talvez chorasse. Talvez não. Talvez tivesse a pior crise de choro da minha vida. Talvez, como muitas vezes fiz com o Fer (e ele odiava!), ficasse muito nervosa e... risse! E em nenhuma dessas hipóteses eu queria alguém de testemunha...

Então, no dia 23 de maio, um domingo, fui para a escola dominical na igreja, dei um jeitinho de mandar as crianças para casa com os meus pais (eu ia pra casa dele, mesmo!), peguei a chave da minha ex-casa (que já tinha "roubado" das coisas da minha mãe, na noite anterior) e... fui pra lá.

Tinha voltado praquela casa três vezes, antes dessa. Na 1a, fui eu e a "torcida do são paulo" (na minha família, só pode ser do são paulo!!!) pegar umas coisas minhas. Para abrir a porta do MEU guarda-roupas, tive que fechar um pouquinho a porta do quarto. Sentei no chão e chorei...: atrás da porta, estava a roupa que ele estava usando naquele sábado, quando decidiu ir pra Bauru e nunca mais voltou. Era uma roupa caseira, daquelas beeeem confortáveis. A roupa ficou lá. Esperando ser vestida de novo. E eu chorei pelo primeiro plano que percebi ter ficado incompleto na nossa vida!... Fiquei imaginando ele tirando aquelas peças, colocando outras mais "de sair", pensando (certamente!!!!!) que queria voltar rápido para vestir as confortáveis e ficar em casa, lagarteando, de novo... Ele adora ficar em casa...

Na 2a vez, fui eu e o Juninho (pobre cunhado! Passou cada uma comigo nos primeiros dias...). Assim, de surpresa. A gente tava na rua, fazendo outras coisas, e eu disse: "-preciso passar lá pegar uma coisa minha". Ele, como bom homem, se "desesperou" ("-não quer ir chamar uma das suas irmãs?", "-você vai ficar legal?"). Eu expliquei pra ele a história das roupas-atrás-da-porta e que já tinha tirado tudo de lá. E ele foi. Só que eu tinha uns livros pra pegar, no escritório. E as coisas do Fer, do estudo da semana anterior, estavam lá: meio abertos, meio fechados, meio com páginas marcadas. Respirei e continuei. Quando olhei para o lado vi uma caixa, enorme, de livros do escritório de advocacia da avó dele, que ele tinha ido ajudar a desmontar naqueles últimos dias. Tinha trazido a caixa pra casa, pra doar para a faculdade e ficar com outros. Surtei! Não ia ficar com mais aquela "pendência". Catei uma caixa (pesadérrima) e fui em direção à porta. Meu pobre cunhado pegou a outra (mais pesadérrima) e me seguiu, quarteirão abaixo, até chegarmos à faculdade de direito. Fui na secretaria, fui mega educada com todos (distribuindo bom-dias e sorrisos, à exaustão, que era para não pensar), deixei as caixas no chão, expliquei calmamente o que eram, pedi se eles poderiam selecionar (que eu não tinha tido tempo pra isso), sorri, agradeci e fui embora. Chorei na casa da minha mãe, longe do Juninho (não ia jogar mais essa pra cima dele, não é?).

A 3a ida à minha ex-casa foi a mais tranquila. Entrei, abri duas malas vazias no chão dos quartos, peguei as roupas das crianças e as minhas, fechei as malas e saí. Simples assim. Sem nem respirar!

Mas, eu sabia que aquela 4a vez ia ser a mais cheia de lembranças de todas. Fui pra lá "fujida", desliguei todos os celulares (o meu e os outros que tinham deixado comigo, de 1000 operadoras diferentes, que era para todo mundo poder me achar, se eu precisasse...), abri a porta do guarda-roupas dele e fiquei lá. Cheirei as roupas. Elas tinham cheiro de guardadas (obrigada, mais uma vez, querido Deus!). Olhei as gravatas. A roupa do nosso casamento ali pendurada (tão estreitinha... ele era tão magrinho, 11 anos atrás... e a gente vivia brincando que o casamento tinha dado um up grade nele!). Os sapatos na cômoda. Gavetas e caixas de coisas íntimas. Dele. Só dele. Daí, eu mesma entendi melhor porque queria ir sozinha: por respeito a ele, também! Se eu morresse, não ia querer minha mãe, sogra, amiga, amigo, tendo que mexer nas minhas coisas, ver o que era o quê pra poder separar o que ficava e o que não, meus pequenos segredos tão expostos assim. Se eu uso creme para celulite, apesar de todo mundo achar um disparate enorme, o problema é só meu. E do meu cônjuge (que saberia disso). E só. E, nesse caso, eu era o cônjuge. Tinha que cuidar dele...

Encontrei coisas que me trouxeram lembranças...
Encontrei coisas que nem me lembrava de termos guardado...
Encontrei coisas que nem sabia que existiam...
Encontrei coisas que ele tinha preparado para nós e não deu tempo de me mostrar (só de me avisar pela internet, numa daquelas noites em que eu estava no hotel, em outra cidade, por causa do trabalho)...
E encontrei tudo sozinha! Foi muito melhor assim...

Ninguém me julgou. Nem a ele. Seus pequenos segredos morreram comigo e os meus com ele. Conforme o combinado.

Coloquei tudo na mala (enorme), fechei, tive uma dificuldade imensa de levar para o carro, coloquei no porta-malas. Fui pra casa da minha mãe. Almocei. Fui pra Ituverava, à noite. Coloquei as crianças na cama. Só quando fui descarregar o carro é que percebi que "ele", de alguma forma, tinha vindo conosco. Que meu marido, agora, se resumia a uma mala de recordações. E só. Não me sobrou mais nada.

E eu sentei e chorei por horas, naquela madrugada...

4 comentários:

Unknown disse...

Mais uma vez não sei o que dizer... tratando-se do Fer, tratando-se de você, das crianças, da família toda... não tem explicação...

O que me conforta é que ele sabia o quanto era querido, vc sempre fez todos a sua volta saberem disso.. e conseguiu passar isso pra ele, valorizar "o ser" e não "o ter" ...
por isso as lembranças são tantas e tão especiais e isso nem a morte pode apagar...

Cele disse...

Eu consegui ler e ó: eu não fiz sozinha. Mas eu já tinha dado um jeito no essencial quando a trupe chegou para a divisão dos bens. Duro agora é encontrar meu irmão e meu cunhado usando as roupas que eram dele! Mas passa. Quanto à postagem do currículo, eu não completei a frase, mas o que eu queria dizer é que "no dia que eu estiver à toa, ele vai estar na mira". Longa história, depois explico! Muitos beijos! Obrigada por me ler! Também acho que o mais importante é ter histórias para contar depois de tudo.

Sheila Mendes disse...

Mirys, cheguei em casa e vim direto pro computador, precisava conhecer mais um pouco da sua história, não por curiosidade, mas pra tentar entender o porquê de Deus fazer certas coisas em nossas vidas. Lendo esse post agora, não aguentei e chorei. Acho que é pq tenho pouco tempo de casada e ninguém imagina viver e passar por uma história como a que vocês estão vivendo.
Contei para o meu marido sobre vocês, outro dia mesmo estávamos conversando sobre como a nossa vida passa rápido e que não sabemos quanto tempo ainda nos "resta" por aqui na terra. No ano passado, no final do ano, estava chovendo muito aqui em BH, ele foi trabalhar e ao chegar lá, uma árvore caiu bem na frente do carro, e era uma árvore bem grande, por frações de segundo ela teria caído sobre o carro do lado que ele estava. Quando ele me contou, só consegui agradecer a Deus por ter lhe dado esse livramento.
Tenha uma ótima noite.
Abraço.

Micha Descontrolada disse...

nossa, imagino a sua dor, mas não sei o q dizer, pq só vc viveu isso. e imagino o qto foi difícil.


Beijossssssss
┌──»ʍi૮ђα ツ